sábado, 26 de janeiro de 2008

Entrevistas, textos, artigos Dr. Jaime Mendes

1.
Revista OM, 10.10.2007
Lista Alternativa para a Secção Regional Sul da Ordem dos Médicos

No limiar da minha carreira hospitalar, mais de 35 anos, entre hospitais suíços e portugueses, é meu dever regressar às primeiras linhas de combate pela defesa do SNS.

O ataque ao Serviço Nacional de Saúde que temos vindo a assistir nos últimos anos por parte de governos obcecados pelo déficit e pelas contas públicas, esquecendo o homem, verdadeira razão da sua existência, fere gravemente os hospitais públicos que formaram gerações de profissionais de saúde. Pessoas dignificadas pelas carreiras médicas, com os vários concursos a que foram sujeitos ao longo da sua vida e que, com todas as vicissitudes, ainda são uma nota de distinção entre os seus pares.

A maioria dos nossos gestores públicos, pressionados para apresentar reduções de despesa, vai pelo caminho mais fácil, bloqueia a entrada de novos profissionais de enfermagem e médicos, e relega para um plano secundaríssimo os concursos, promovendo as contratações individuais e a requisição de tarefeiros.

O hospital público, com a falta de meios financeiros e de recursos humanos, irá cair inexoravelmente na situação existente em meados do século passado, tornando-se no hospital dos pobres e da formação médica.

Porque, não tenhamos ilusões, os hospitais privados podem vir até a prestar melhores cuidados, o que duvido, mas vão desprezar a formação dos seus quadros médicos, transformando os hospitais públicos, cada vez mais, em grandes supermercados, onde os médicos escolhem o que querem para a sua formação para depois venderem, ao melhor preço, os seus conhecimentos aos hospitais privados.

O fracasso das medidas tomadas para salvar ou melhorar os hospitais públicos tem várias causas:

Ministros da Saúde apostados na onda de liberalização e privatização que vem da Europa, destruindo os serviços de saúde estatais.

Os “novos” gestores que consideram a Saúde uma despesa a fundo perdido e que pressionam as direcções dos serviços para a diminuição de custos, mesmo penalizando a qualidade dos serviços, numa tentativa vã de remediar os anos de despesismo.

Nunca ter sido tomada a medida de separação clara entre o sector público e privado, o que lançou e lança, frequentemente, a dúvida sobre a idoneidade dos profissionais de saúde, e tem permitido (felizmente a um pequeno número) o absentismo, o laxismo e o individualismo.



O diagnóstico da doença da Saúde em Portugal está feito há muito, o que tarda é a terapêutica e será preciso muita determinação política para tomar as medidas necessárias para salvar os hospitais públicos e o SNS.

A Direcção da Ordem dos Médicos tem muita responsabilidade na situação vigente, estando mais preocupada com as actividades, tipo secção social das Associações Académicas, do que na defesa dos médicos perante o ataque de medidas governamentais como a destruição das Carreiras Médicas e do SNS.

Face a esta situação ou continuamos a cruzar os braços e a assistir à morte lenta dos hospitais públicos ou tentamos reagir.

É por esta e outras razões que me candidato a Presidente da Secção Regional Sul da Ordem dos Médicos, aceitando o desafio lançado pelo Candidato a Bastonário Prof. Doutor Carlos Silva Santos.

São duas eleições distintas, com posições programáticas próprias, embora com um traço comum, particularmente nos pontos apresentados no Manifesto aos Médicos, lançado em Março de 2007:

· A defesa dos valores éticos e deontológicos da profissão médica;
· O direito constitucional à saúde;
· A defesa e dignificação das Carreiras Médicas;
· A recusa dos contratos individuais de trabalho e a consagração da contratação colectiva;
· O apoio à medicina liberal;
· A clara separação entre o sector público e privado;
· A manutenção da Titulação Única;
· A ocupação das vagas dos quadros de pessoal médico nas unidades de saúde deficitárias;
· A dinamização do Fórum Médico.

A equipa que comigo vai percorrer este caminho é constituída por profissionais prestigiados com provas dadas na defesa do SNS.

Uma palavra de apreço, em especial, para o meu mandatário, Dr. Henrique Delgado Martins, distinto Ortopedista que muito me honrou ter acedido prontamente ao meu convite.




A defesa dos valores éticos e deontológicos da profissão médica

As associações médicas pugnaram, desde sempre e ao longo dos anos, pela defesa e vigilância dos valores éticos e preceitos deontológicos a que os profissionais devem obedecer.

Apesar dos novos desafios e conceitos morais que a sociedade em mutação constante coloca, os preceitos consignados no Juramento de Hipócrates continuam, no essencial, válidos e são os suportes da prática médica que se impõe defender.

Os poderes públicos e as seguradoras pretendem alterar o acto médico pondo muitas vezes restrições que ferem a deontologia. A Medicina representa um poder único e, por isso, a Ordem tem uma palavra a dizer no cumprimento da nossa missão:- tratar os doentes com os melhores meios ao dispor e, na falta deles, fazer todos os esforços para os obter. Isto quer dizer a defesa das melhores condições de trabalho, de formação e remuneração digna.

A Ordem dos Médicos tem também obrigação de analisar profundamente e com bases científicas, interferir e propor soluções a novos problemas que se colocam aos médicos, nomeadamente sobre a interrupção voluntária da gravidez, a eutanásia, a colheita de órgãos, a reprodução medicamente assistida, a manipulação genética, a criopreservação de embriões.

A Ordem deve estar atenta e intervir rapidamente nos atropelos da ética por parte de profissionais ou outros agentes que transformam a Medicina numa venda a retalho.

Assiste-se hoje, em vários países, à venda aos turistas de pacotes de cirurgias de hérnias ou de próteses da anca, com garantia de recuperação, em hotéis de 5 estrelas, publicitada em revistas de cabeceira de quarto de hotel, entre a promoção de cerimónias de casamento com lua de mel a preços módicos e a venda de colares de jóias.

Em Portugal há já concursos televisivos e radiofónicos que oferecem cirurgias plásticas aos concorrentes; a Medicina Física e de Reabilitação é praticada em vãos de escada; clínicas e hospitais escolhidos para operar doentes inscritos no SIGIC, sem contratos com cirurgiões especializados nas áreas específicas requisitadas, etc.., etc…
(uma tomada de posição da actual Direcção da Ordem dos Médicos não se fez ouvir)

Compete à Ordem criar condições para que a medicina liberal se exerça com dignidade, impondo tabelas mínimas nas convenções e contratos dos médicos com o Estado ou as seguradoras, com valores dignos e prestigiantes do acto médico.
(uma tomada de posição da actual Direcção da OM não se fez ouvir)

Certos que os novos contratos individuais de trabalho com os hospitais, quer públicos quer privados, irão provocar uma venda ao desbarato da mão-de-obra médica e ao “salve-se quem puder”, prejudicando os doentes, criando atritos entre os médicos e aumentando o individualismo que impera na classe, é nossa obrigação a recusa destes contratos.
(uma tomada de posição da actual Direcção da OM não se fez ouvir)


A defesa e dignificação das Carreiras Médicas

Temo que o que foi relatado há 50 anos, no relatório sobre as carreiras médicas, não se torne realidade

“1º - Insegurança profissional e económica provenientes dos sistemas de remuneração, recrutamento e condições de trabalho;
2º- Falta de incentivo, proveniente da ausência quase completa de graduação profissional, mantida por uma carreira contínua;
3º- Grandes insuficiências no aperfeiçoamento científico e técnico, provenientes da escassa preparação pós-universitária;
4º- Imperfeita delimitação do campo da Clínica Geral com as especialidades e independência do sector da Saúde Pública.”

A Formação Profissional e as Carreira Medicas são problemas indissociáveis, a sua defesa intransigente, modernização e dignificação estarão no centro da nossa acção, única forma de contrariar a desvalorização da profissão que, em apenas umas décadas, perdeu o seu tradicional prestígio.
(uma tomada de posição da actual Direcção da OM não se fez ouvir)

Assiste-se já a uma deserção das profissões ligadas à Saúde, devido ao descontentamento, à falta de reconhecimento social e de realização profissional, à insuficiente remuneração e aos problemas de formação, entre outros. Como disse a OMS, o déficit de recursos humanos em todo o Mundo é um dos grandes problemas de saúde à escala global.

Entre nós, assiste-se a um desalento dos jovens médicos que não se sentem defendidos, notam deficiências na sua formação e falta de apoio do Estado e da sociedade, já sentem como os seus colegas de há 50 anos insegurança profissional e económica.
A reforma das Carreiras Médicas começou mal, com um primeiro ano profissionalizante não remunerado.
(uma tomada de posição da actual Direcção da OM não se fez ouvir)

A formação médica pós-graduada tem tais exigências de preparação científica que não se coaduna com a aprendizagem em 12 horas de Banco, dadas por tarefeiros contratados, e mais 3 a 4 horas diárias nos Serviços.

O novo tipo de contratos praticados, a fuga de médicos mais experientes para os hospitais privados, devido a remunerações baixas praticadas nos Hospitais Públicos, será a machadada final nas Carreiras Médicas. Uma sociedade que trata mal os seus prestadores de cuidados é uma sociedade doente.
(uma tomada de posição da actual Direcção da OM não se fez ouvir)

Além da defesa intransigente destes princípios atrás enunciados, propomos:

· A realização de um encontro de jovens médicos, para com eles estudar e tomar posições face ao futuro das carreiras e dos contratos de trabalho;
· A elaboração de um Código de Trabalho Médico;
· Uma maior valorização da intervenção das Direcções dos Colégios de Especialidade e Democratização interna da Ordem;
· A reavaliação e negociação dos valores dos actos médicos com as convenções Estatais e Seguradoras.

A Medicina é uma profissão fascinante que apesar de todo o avanço tecnológico não se desumanizou e apresenta, como nunca, um maior vigor científico.

O que faz falta é uma ORDEM DOS MÉDICOS eficiente, um forte apoio político e social a todos os profissionais da saúde.



Jaime Teixeira Mendes
Chefe de Serviço de Cirurgia Pediátrica
Candidato à Presidência do Conselho Regional do Sul




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